Desafio Corujesco: Um autor que indico para todo mundo

Juro que quando vi o tema do Desafio Corujesco proposto pela Lu, desatei a rir, por que convenhamos qualquer leitor do Bibliophile sabe quem será o indicado. Contudo, como também é factível que esse espaço precisa de renovação e dedicação, não vou me abster em falar do meu amado Gaiman, salve, salve!

“Lembre-se do seu nome.
Não perca a esperança – o que você procura será encontrado.
Confie nos fantasmas. Confie que aqueles que você ajudou vão ajudá-lo por sua vez.
Confie nos sonhos.
Confie no seu coração, e confie na sua história.”

Hoje vou falar um pouso de uma obra que ainda não apareceu por aqui, o belíssimo “Instruções: Tudo que você precisa saber durante a sua jornada”. O livro é de uma simplicidade absurda e ainda o poema sobre o que encontramos em uma jornada ao mundo dos contos de fadas é infinitamente encantador. Sua força reside justamente na delicadeza dessa história sobre descobertas e autoconhecimento.

instruções
O livro é ilustrado por Charles Vess, e ele como sempre, o faz de forma maravilhosa, particularmente adoro a parceria entre os dois. Instruções não é um texto inédito ele já foi publicado na coletânea Coisas Frágeis 2, mas isso não tira o brilho desta obra, que posso resumir como uma declaração de amor à fantasia.

Bônus: lista dos motivos pelos quais todo mundo deveria se converter à leitura de Neil Gaiman (em cinco itens):

1 – Gaiman tem o poder de escrever histórias que mexem com o leitor de formas nunca antes imaginadas.
2 – Gaiman é sarcástico e irônico sem perder a classe.
3 – Gaiman ressignifica histórias, transformando-as em algo totalmente novo
4 – Gaiman tem uma escrita peculiar que te prende, que te deixa sempre com um gosto de quero mais.
5 – Gaiman é gentil e fofo, e sim isso é motivo para ler sua obra 😉

Os filhos de Anansi

filhos_de_anansiMais uma vez, Gaiman marca o retorno do blog!
Dessa vez a obra é “Os filhos de Anansi”, que como o título direto e conciso já entrega, conta a história dos filhos de Anansi, o deus aranha. Para quem já leu “Deuses Americanos”, Anansi já é um velho conhecido, mas agora o foco são seus filhos.
Começamos conhecendo Charlie Nancy, ou melhor Fat Charlie, que em busca de um rompimento total com o pai, muda-se para Londres, onde leva uma vida discreta e pacata, trabalhando como contador e dedicando-se aos preparativos de seu casamento com Rosie.
A morte do pai desencadeia acontecimentos que tornam a vida de Charlie um verdadeiro caos, primeiro ele descobre que seu pai é um deus, e logo depois que tem um irmão, Spider.
Gaiman, como sempre é brilhante na construção da história, ele consegue misturar de tudo e mais um pouco em um livro sem que ele fique parecendo um samba do crioulo doido. Bem pelo contrário, é um leitura fluída e que prende pela riqueza de detalhes.
Uma das características que mais me fazem morrer de amores pela escrita de Gaiman é a capacidade que ele tem de permear o trivial com o fantástico. De nos pegar pela mão e ir descortinando o cotidiano, de nos fazer acreditar que a magia está mesmo em tudo.
O humor tipicamente inglês de Gaiman está a toda em “Os filhos de Anansi” e isso torna a leitura ainda mais deliciosa. As risadas são garantidas com sacadas inteligentes e diálogos extremamente bem construídos e divertidos.
Enfim, mais uma obra do Gaiman que indico com todas as forças.
Todas as histórias são de Neil Gaiman!

Mais do mesmo

oceanAinda embriagada com a leitura de O oceano no fim do caminho, descobri algumas coisas bem interessantes sobre o livro para compartilhar por aqui:

1 – A prefeitura de Portsmouth  (Inglaterra),  onde se passa a história quer batizar uma rua com o nome do livro. A cerimônia de batismo deve ocorrer em 18 de agosto com a presença do próprio Gaiman. (Omelete)

2 – “Para Amanda, que queria saber”, essa é a singela dedicatória do Gaiman no início do livro, para quem quiser saber o significado e a força dessas palavras, vale a pena conferir a postagem da própria Amanda Palmer. (Blog da Amanda, em inglês)

3 – O Reinaldo, postou no excelente blog Darwin e Deus, uma entrevista  de aquecer o coração dos fãs e nos fazer morrer ainda mais de amores pelo Gaiman, simplesmente imperdível. (Darwin e Deus)

 

O oceano no fim do caminho

oceano

“No meu sonho, aquela era a lígua do que é, e tudo o que fosse falado nela se tornava realidade, porque nada dito com ela pode ser mentira. A língua é o fundamento da construção de tudo.” (p. 56)

Depois de dez anos, eis que surge um novo romance adulto do Gaiman, confesso que esperei pelo lançamento como se não houvesse amanhã 😉
Um leitor mais aplicado e que acompanha a obra de Gaiman facilmente encontra familiaridade com as referências presentes na história, o próprio Gaiman já falou em entrevistas sobre as ligações entre seus livros, e é sempre muito gratificante perceber o poder que ele tem de reinventar e articular o mesmo universo literário em histórias tão diferentes.
O oceano no fim do caminho tem um protagonista sem nome, que aos 47 anos retorna a sua terra natal para um enterro, e se vê recordando uma história há muito enterrada nas profundezas do seu subconsciente.
Somos sugados para as lembranças desse homem e a partir de então, vemos tudo sob a ótica de um assustado menino de 7 anos, que vê seu mundo ser povoado de acontecimentos e criaturas pertubadoras.
Gaiman é um mestre da escrita, sim isso soa um clichê, mas nem por isso deixa de ser visceralmente verdadeiro, poucos autores que li, conseguem fazer o que ele faz. Ele cria um universo onírico em que não sabemos mais se estamos apenas presenciando a explicação criada pela mente de uma criança para elaborar acontecimentos terríveis ou, se o horror mágico é mesmo real, o que é extremamente inquietante, porque na verdade as duas possibilidades são essencialmente perturbadoras.
A angústia é um sentimento constante durante a leitura, assim como a sensação inquietante de sentir-se encurralado e sem perspectivas. Contudo, a melancolia é pungente e sentimos que mesmo perturbado pelas lembranças, o menino sente uma nostalgia por tudo que viveu.
Enfim, Gaiman mais uma vez me surpreendeu e me fez amá-lo ainda mais, este é, como ele mesmo define, um “um livro sobre o poder que as histórias fornecem para enfrentar a escuridão dentro de cada um de nós.”

GAIMAN, Neil. O oceano no fim do caminho. Tradução de Renata Pettengill. Rio de Janeiro: Intrínseca, 2013.

Neil Gaiman

Esses dias me dei conta de que geralmente não escrevo sobre meus escritores favoritos aqui no blog, falo dos livros sim, mas não da minha relação de fã, sim eu tenho alguns ídolos literários e resolvi que de vez em quando vai rolar um texto falando deles e é claro que vou começar por Neil Gaiman, nenhuma novidade não é mesmo? 😉

*****

Eu conheci o Neil Gaiman através do extinto fórum Meia Palavra vi um tópico aqui, outro ali, mas o início foi difícil, vocês não imaginam o choque que foi sair a procura de Sandman e encontrar vários arcos esgotados ou a preços exorbitantes até mesmo para mim que não reclamo de preço de livro. Então eu comemorei feito maluca quando em 2010 soube que a Panini ia lançar os 4 volumes da Edição Definitiva de Sandman, comprei os três que já foram lançados ainda na pré-venda, e eles valeram cada centavo que paguei por eles, pagava de novo e de novo só pelo prazer de reler uma edição tão caprichada.

Mas então que vocês devem estar pensando que eu idolatro o sujeito e só li uma obra dele, é claro que não, pois quem não tem cão caça com gato, e já que eu não tinha Sandman, me joguei na minissérie de 4 espisódios “Os livros da Magia” e pesquisando sobre onde encontrar para comprar acabei descobrindo que tinham acusado J.K. Rowling de plagiar essa série e aí cai de amores de vez pelo Gaimam porque ao invés de entrar numa dessas de brigar para ver quem é mais criativos e coisa e tals, ele fez estas  declarações:

“O arquétipo do jovem feiticeiro tem vários outros precedentes na literatura” .

Alguns idiotas processaram J.K. Rowling (ninguém os contou sobre os Livros da Magia, ou eles me processariam também). Não que eu esteja sugerindo que Tim Hunter  [personagem bruxo de Livros da Magia] seja igual a Harry Potter. Eu nunca acreditei que ela  [J.K.]  os tenha lido. Só estou dizendo que esses idiotas poderiam me processar também.

E eu pergunto tem como não amar um autor que diz isso? Em um mundo meio caótico em que muitos querem mérito por aquilo que outros fizeram me dá um certo orgulho alheio de ver que tem gente que assume sim que se inspira em outras ideias e Gaiman faz isso muito bem, como descobri no seu excelente “O Livro do Cemitério” que é inspirado publicamente em O Livro da Selva, de Rudyard Kipling mas é outra história.

Mas antes de ler  O Livro do Cemitério eu li  Stardust, e tem uma história bem legal porque eu assisti primeiro o filme, o guri que atende na videolocadora que frequento já conhece meus gostos me indicou: ” Ei chegou um filme que tu vais adorar, é fantasia pura” levei e como ele profetizou adorei mesmo, ai fui conferir os extras (amo extras de filme) e quase surtei quando descobri que o filme era baseado em uma história do Gaiman, foi muito lindo ver ele falar das inspirações que o levaram a escrever Stardust:

**********

“Lembro de duas fagulhas criativas para Stardust. O Povoado de Muralha, a ideia que temos um vilarejo perto de Faire foi metade da inspiração. E aquilo foi mais ou menos em 1988 nas minhas primeiras férias. Minha mulher e eu deixamos nosso filhos e fomos para a Irlanda por uma semana. Em algum lugar de Cork, passamos por um campo com um belo muro, e havia um bruraco no muro, dava para ver um floresta fabulosa pelo buraco. Olhei aquilo e pensei: não seria legal se do outro lado do muro estivesse uma terra mágica com tudo o que você sempre sonhou?

Esse foi o começo.

Depois em 1992 eu estava no deserto, em Tucson no Arizona. Na Inglaterra quando eu era criança quando a gente via uma estrela cadente, era um fiapo de luz. E a gente dizia: “Ah uma estrela cadente!”. No deserto com esse céu de veludo, azul escuro eu vi uma estrela cadente. Eu vi um meteorito. E era o mesmo que ver uma estrela caindo, ver a sequência toda e essa coisa brilhante, feito um diamante, em chamas na sua queda. Fiquei ali olhando a estrela caindo e pensei: daria ara tentar achá-la. De repente, tudo se juntou com a ideia do muro, achei que se caísse do “lado errado” do muro não seria um meteorito, não seria um monte de rocha, seria uma garota. E aí, eu tinha a história.”

É claro que depois de assistir esse video eu preciva ler o livro, e com ele Gaiman foi sendo alçado cada vez mais ao posto de autor predileto, a maneira como ele resiginifica tudo que já foi escrito, e principalmente a forma sincera com que ele lida com suas fontes de inspiração me fazem admirá-lo, mais e mais e mais.

Então veio Coraline. Ah, Coraline! Essa história de dar medo em qualquer um, não apenas nas crianças mas também nos marmanjos simplesmente porque ela mexe com nossos medos mais ancestrais, uma coisa que me faz adorar esse livro é que Coraline é tão corajosa, ela está lá morrendo de medo, mas enfrenta ele mesmo assim, e isso sim é coragem!

Lugar Nenhum foi o primeiro romance adulto do Gaiman que li, e apesar de muitos assegurarem que ele é um livro abaixo dos padrões dele, eu amei, adoro as referências, a maneira como a história vai nos absorvendo que quando nos damos conta já amanheceu e ainda estamos vidrados na história.

Os lobos dentro das paredes entrou na minha vida porque o meu pequeno queria ler uma história de terror, uns dias antes do pedido tinha visto uma resenha sobre o livro e foi uma escolha certeira, que só me fez lembrar o quanto Gaiman é genial, ele consegue escrever para crianças de uma forma tão peculiar, é um autor que respeita as crianças, e também por isso tem meu respeito. E tem uma coisa muito curiosa sobre essa coisa de ídolo: o pequeno meio que já era fã do Gaiman, de tanto me ouvir falar ele já tinha várias referências que com certeza impactaram na leitura que ele fez, e isso ficou bem claro quando em uma ida à livraria ele me diz: “vou conferir se tem algum Gaiman novo na sessão infantil” e foi assim que trouxemos para casa o totalmente  nonsense Cabelo Doido, outra obra pra lá de adorada e encantadora.

Se Coisas Frágeis fosse apenas composto pelos contos “O Problema de Susan” e “O Monarca do Vale” a leitura já teria sido fantástica, o primeiro resignifica o final da personagem Suzana da série “Crônicas de Nárnia” e eu como detestei o destino que C.S. Lewis reservou para ela adorei esse novo olhar, já o segundo porque me apresentou Shadow, mas nem de longe me preparou para o que estava por vir duas leituras adiante.

No meu panteão literário ao lado de Gaiman está Terry Pratchett, sendo assim um livro escrito a quatro mãos pelos dois não poderia me decepcionar e Belas Maldições é um livro tão fantástico e bem humorado que sempre que recordo de uma passagem um sorriso, ou melhor uma gagalhada, brota espontaneamente.

Odd e os gigantes de gelo foi uma surpresa muito doce, sempre me surpreendo com os livros que o Gaiman escreve para o público infanto-juvenil porque sempre encontro neles um respeito à criança que falta a muitos outros autores, ele não nivela os pequenos por baixo, não duvida da capacidade de compreensão delas, escreve com o mesmo apuro que encontramos em sua obra adulta, ou seja amor em estado bruto.

E aí meus caros quando achei que não poderia mais elevar o nível de idolatria eis que me jogo na leitura de Deuses Americanos e o estrago está feito porque simplesmente descubro que sim, eu podia me apaixonar ainda mais pelo Gaiman, depois dessa leitura passei a compreender quando os amigos diziam que eu deveria ler esse livro, que se eu tinha curtido “Lugar Nenhum” eu ia amar Deseus Americanos, eles estavam cobertos de razão, sem sombra de dúvidas uma das leituras mais fantásticas e significativas que já fiz e que recomendo para todos.

Para saber um pouco mais sobre o Gaiman, recomendo com todas as minhas forças o especial que a Lu escreveu lá no Coruja em teto de zinco quente e o artigo que a Núbia escreveu no blog Blá, blá, blá aleatório, na sessão “Escritores de Quinta”, elas são ninjas e conseguem manter o foco sobre os fatos da vida e da carreria dele sem esbarrar, como eu, na idolatria desenfreada 😉

 

Meme Literário 2012 – Dia 31

Dia 31 – Qual o livro que você leu esse ano que mais gostou? Fale sobre ele.

Báh que pergunta terrível de responder, esse foi um ano de poucas e ótimas leituras, acho que nem um top 10 me salvaria aqui, como gosto de seguir as regras vou eleger Belas Maldições: As Belas e Precisas Profecias de Agnes Nutter, Bruxa,  Neil Gaiman e Terry Pratchett, pelos motivos mais óbvios possíveis: é um livro simplesmente fantástico, foi escrito pelos meus ídolos literários, fala do armagedon, as personagens tem nomes impagáveis como Não-Cometerás-Adultério Pulsifer, é sarcático, hilário, crítico, irônico…. ahhhhh chega de palavras tolas,  é um livro inefável!!!

“— Nossa — disse Aziraphale. É ele.

— Ele quem? – perguntou Crowley.

A Voz de Deus — disse o anjo. — O Metatron. Os Eles arregalaram os olhos.

Então Pimentinha disse:

— Não é não, O Metatron é de plástico e tem um canhão laser e pode se transformar num helicóptero.

— Esse é o Megatron Cósmico — disse Wensleydale fraco. — Eu tinha um, mas a cabeça caiu. Acho que este é diferente.”

Belas Maldições

" Crianças! Provocar o Armagedon pode ser perigoso. Não tentem isso em casa."

Ler a última palavra de Belas Maldições, As Belas e Precisas Profecias de Agnes Nutter, Bruxa me deixou sem fôlego, desnorteada e principalmente em êxtase, êxtase que só é causado por leituras simplesmente fantásticas. Inefável me parece o único adjetivo capaz de descrever o impacto desta leitura para mim.

Um livro que estampa na capa os nomes de Neil Gaiman e Terry Pratchett tem um poder avassalador sobre mim, comprei Belas Maldições sem saber nada, nadinha sobre a história, apenas por ele ter sido escrito a quatro mãos pelos meus dois ídolos literários. Isto posto, espero que os leitores não busquem neutralidade nesta resenha, todos os textos que já produzi ou que produzirei sobre eles são e serão passionais elevados à máxima potência.

Quando descobri que o livro era sobre o fim do mundo fiquei ainda mais animada para ver o que Gaiman e Pratchett tinham aprontado, separados eles nunca me decepcionaram mas e juntos? Ah juntos, eles são simplesmente geniais!

As referências à passagens bíblicas, literatura, o cotidiano londrinho, cinema, música permeiam texto inteiro fazendo com que a leitura seja, como diria Lu, um grande jogo de palavras cruzadas, muitas delas se perdem, mas outras fazem parte do imaginário popular e do senso comum, e isso torna o texto hilariante até mesmo para o mais desavisado dos leitores. E as notas de rodapé? Não conheço ninguém que use notas de rodapé como Pratchett, elas fazem parte do texto de forma tão instrínseca (ou não) que não cansam e nem tornam a leitura enfadonha, muito pelo contrário, várias risadas são fruto da leitura delas.

Apocalipse que se preze tem que ter um anticristo e neste caso, ele é um guri adorável, que ama a cidade onde vive, quer salvar as baleias e tem um cão infernal chamado Cão, e tudo isso porque irmã Maria, da Ordem Faladeira de Santa Beryl (a ordem mais bizarra e hilária da qual se teve notícias) fez aquele truque da ervilha com três copinhos.

"É assim que acontece, você acha que está no topo do mundo, e de repente jogam o Armagedon em cima de você."

As personagens criadas por Gaiman e Pratchett são tão apaixonantes que poderia facilmente escrever um tratado de muitas e muitas páginas apenas falando delas, vou tentar apelar para o poder da síntese, mas não posso garantir nada.

Vamos começar com Aziraphale e Crowley que apesar de serem um anjo e um demônio vivem na terra há seis mil anos e não querem que ela seja destruída. As passagens com eles são memoráveis, gostei muito das divagações filosóficas, principalmente quando eles debatem sobre a natureza humana e demonstram verdadeiro assombro diante das coisas que as pessoas criam e fazem, como a bomba-âtomica e a inquisição, coisas tão absurdas que, segundo Crowley, nem mesmo o diabo as conceberia.

“Em matéria de maldades, humanos dão de dez a zero no capeta.”

E o que dizer dos "Os quatro cavaleiros do apocalipse"? Confere comigo: Guerra, Fome, Peste e Morte, certo? Errado. A Peste se aposentou em 1936 quando Alexander Flemming descobriu a penicilina. A forma como eles vão aparecendo no texto, a maneira como se adaptaram ao mundo contemporâneo é simplesmente fantástica.

Teve outras duas coisas relacionadas com as referências que falei lá em cima que gostei, primeiro aquelas que estão nos nomes das personagens, leitores de O Senhor dos Anéis não deixarão passar despercebido o nome da Pimentinha, por exemplo. E segundo quando ela confunde Metatron com megatron, impossível não se acabar de tanto rir.

"— Nossa — disse Aziraphale. É ele.

— Ele quem? – perguntou Crowley.

A Voz de Deus — disse o anjo. — O Metatron. Os Eles arregalaram os olhos.

Então Pimentinha disse:

— Não é não, O Metatron é de plástico e tem um canhão laser e pode se transformar num helicóptero.

— Esse é o Megatron Cósmico — disse Wensleydale fraco. — Eu tinha um, mas a cabeça caiu. Acho que este é diferente."

Destaque também para as bruxas da família Nutter, tanto Agnes que escreveu o livro "As Belas e Precisas Profecias de Agnes Nutter, Bruxa" que contém todas as previsões sobre o apocalipse, quanto Anathema Device, descendente de Agnes, para quem o livro foi escrito são personagens muito peculiares e encantadoras. Outra família que vale a menção é a Pulsifer nem que seja só pelos nomes com os quais costumava batizar seus filhos, nomes como Não-Cometerás-Adultério Pulsifer, que diga-se de passagem é um caçador de bruxas.

" – Amarrai bem – disse ao caçador de bruxas atônito. E então, quando os aldeões se aproximaram da pira, ela ergueu a bela cabeça à luz do fogo e falou: – Chegai mais perto, boa gente. Chegai perto até que o fogo quase vos queime, pois eu digo que todos devem ver como a última bruxa verdadeira na Inglaterra morre. Pois bruxa eu sou, por tal sou julgada, mas não sei qual possa de ser meu verdadeiro Crime. E portanto deixai minha morte ser uma mensagem para o mundo. Chegai mais perto, eu digo, e marcai bem o destino de todos os que lidam com coisas que não entendem.

E, aparentemente, ela sorriou e olhou para o céu sobre a aldeia e acrescentou:

– Isso tambem serve para você, seu velho tolo."

Enfim este é um dos melhores livros que já li, para além da minha idolatria com os autores a obra é simplesmente fantástica, todo texto é permeado de questões muito mais aprofundadas do que se pode pensar de um livro tão deliciosamente hilário e irônico, mas é só ir além para perceber que a obra é acima de tudo sobre os seres humanos e sobre aquilo que nos torna o que somos, Gaiman e Pratchett usaram toda a maestria e construiram personagens tão próximas de nós que a reflexão é inevitável.

Eu só gostaria de dizer — disse ele — que se não sairmos desta, que… eu sei que, bem no fundo, havia uma fagulha de bondade em você.

— Isso mesmo — disse Crowley amargo. — Estrague meu dia.

Aziraphale estendeu a mão.

— Foi bom te conhecer — disse.

Crowley apertou-a.

— Até a próxima — disse. — E… Aziraphale?

— Sim?

— Lembre-se de que eu sei que, no fundo, você era filho da puta o suficiente para valer a pena gostar.